maio 23, 2014

Ecos

À minha volta, só ouço ecos. Cada passo, cada arrastar de malas, um copo do armário que sai do armário para se encher de água da torneira. A casa vazia multiplica cada gesto, a dizer que numa nova vida tudo conta, tudo se ouve.

Espalhados pelo chão, estão muitos sacos à espera de um lugar que lhes pertença. Uma vida à espera de ser desempacotada.

Se me perguntassem há cinco anos o que é que eu queria ser “um dia”, a resposta estaria na ponta da língua. Queria ser jornalista a tempo inteiro, poder contar histórias todos os dias, ser livre, independente. Queria ter o meu espaço, o meu lugar no mundo.

De repente, tudo se tornou verdade, sem tempo para me dar conta que esse “dia” chegou, está aqui para ser vivido plenamente. Foi tudo muito rápido. Imaginava as coisas em câmara lenta, rumo a um futuro sonhado, ideal, em que me levantava da cama num salto, fazia café, tomava banho e fechava a porta da rua com um sorriso, a pensar que tudo estava no lugar certo.

Na divisão ao lado, a que decidi chamar “sala”, estão caixas cheias de madeira, que amanhã hão-de se transformar em móveis, se o engenho nos ajudar. Falo no plural porque há coisas que são impossíveis de realizar no singular. Montar móveis é uma delas, construir uma vida é outra. Eles vão estar cá para ajudar a que tudo isso aconteça.

Às vezes sinto que a Inês de há cinco anos quer ralhar com esta de agora, por não estar a viver tudo mais intensamente, como nos filmes, com música de fundo. Por não estar sempre a dançar no pensamento e no coração.

É um final feliz? É demasiado cedo para finais. Há coisas que não podem simplesmente ser dadas como alcançadas. O que virá a seguir? Quem quero ser daqui a cinco anos? O mesmo que agora? O mesmo café, o mesmo banho, a mesma porta a fechar?

Quando os sonhos se realizam, o que vem depois? É só desfrutar? Sentar e aproveitar?

Saio à minha mãe. Detesto rotinas, todos os dias têm que ser diferentes. Vario no pequeno-almoço, não compro duas caixas iguais de cereais. Se puder, vario nos transportes para o trabalho e no supermercado onde vou. Assusta-me a vida que se repete e não muda.

“É isto que queres?”

A pergunta assalta-me vezes sem conta, no banco do metro, no meio de duas colheres de sopa ou durante o banho. Tento não lhe dar muita importância, afinal sou uma sortuda, e os sortudos não se podem queixar.

Se calhar é só desfrutar.