janeiro 15, 2011

Somos pequenos monstros - e depois?

A parte má de nos habituarmos a não fazer nada é que depois acabamos sempre por ter de fazer alguma coisa. “Estudo” e “trabalho” foram palavras que não encaixaram nos meus últimos meses – para mim, Erasmus foi sempre borga.

Agora vem a parte dura. Estudar, estudar, trabalhar, trabalhar. Cinco vezes mais do que se tivesse estudado regularmente. Mas “estudar regularmente”, para mim, é um mito. Sempre funcionei com a pressão da véspera. E, agora, a véspera não chega. Livros e mais livros em italiano que tenho de meter na cabeça a murro. E escrever? Tentem lá analisar publicidades e relacioná-las com uma tal “Sociosemiótica”, numa língua que não dominam. Fácil não é. Mas lá que é um desafio… é.

Neste momento, Roma para mim são estas quatro paredes azuladas. Às vezes, o alpendre também – quando estamos a ansiar por uma réstia de raios solares, vamos para lá. Faz-nos sentir um bocadinho mais saudáveis. Pelo menos, ouvimos os latidos do Black-Dark-Monsenhor-Fuori e vemos a simpática mãe do nosso senhorio, que de vez em quando passa e pergunta se não temos frio.

Acho que enlouquecia se não as tivesse aqui. Os intervalos entre o analisar de anúncios e as dissertações sobre uns tais “discorsi sociali” são tudo aquilo que me mantém viva. Os temas variam, o modo não. Insultamo-nos mutuamente, rimos que nem umas perdidas, contamos as nossas vidas – mesmo aquilo que não nos atreveríamos a contar a mais ninguém. Fazemos do Facebook o nosso meio de comunicação, como se não estivéssemos sempre a meio metro umas das outras.

Somos peixeiras (afinal, somos do Porto – se temos a fama porque não ter o proveito?), ligamos as colunas no máximo só mesmo para ouvir músicas pirosas, fazemos da nossa casa uma discoteca pimba, dançamos que nem loucas e fazemos os vizinhos ficarem seriamente preocupados connosco. Acordamos e deitamo-nos com a mesma música na cabeça – a da Ágata italiana, obviamente. Bela música essa que já traduzimos para português E português com sotaque do Brasil.

Saímos à noite uma ou duas horinhas só mesmo para pensar que temos vida social. Se bem que eu hoje fiquei em casa, preocupada com o meu trabalho, e em vez de trabalhar estou a escrever no blog – sempre coerente comigo mesma.

Acho que ninguém me reconheceria se me visse neste momento. O cabelo está sempre desgrenhado, a roupa é sempre a mesma – a mais confortável que houver. Afinal, só saio para ir à cantina, e a cantina não conta. Tenho cada vez mais a mania que tenho piada – afinal, rimo-nos todas de tudo e de nada, dá para aumentar um pouco a auto-estima. Tenho também a mania que sei escrever italiano: até já mando o Google Tradutor a um sítio que eu cá sei e faço as minhas próprias traduções, que vêm de uma criatividade incrível. A única manifestação de carinho que consigo libertar de mim mesma é o “engrolhar” à noite na cama – e é só mesmo por causa do frio. Tenho a mania que já ninguém me leva a sério, por isso já não sei falar sem ironias.

No fundo, tornei-me um monstro. Hoje, a Ana chamou isso mesmo à Raquel, e eu sinto-me obrigada a juntar-me ao clube. Estamos a tornar-nos pequenos monstros do trabalho. Faltou-nos a transição entre o “não fazer nada” e o “fazer alguma coisa”. Já não sabemos “fazer alguma coisa” e continuar a ser pessoas normais.

Enfim. Amarguras da vida. Agora vou-me deitar e esperar que a Raquel chegue rápido da discoteca. Não porque goste dela… só mesmo porque está frio.

4 comentários:

Hannah disse...

Bem vinda à loucura!
E eu a julgar que seria uma coisa só minha...
Estás a estudar Inês! DAH!
Começo a achar que andavas mal habituada :P
No final vês que a loucura foi uma experiência enriquecedora e criativa.

Força nisso!

Inês disse...

Anita,
Começo a ficar preocupada!
Pessoas de medicina a dar-me conselhos sobre estudo e a sentirem-se acompanhadas por mim... AHHH!
xD

Força nisso também :)
Obrigada e um beijinho!*

Vitor Hugo Ferreira disse...

Passei 5 anos e meio a dizer "para o próximo semestre é que é... vou estudar desde inicio" (claro que isto era no final da época de exames)

Nunca cumpri tal coisa... sempre fui um estudante de época de exames... estudar sem pressão nunca fez sentido... Nem sei o que isso é!!!

Boa sorte e "Força nisso" a ambas...

Raquel Teixeira disse...

Claro que é porque gostas de mim e o meu calor humano é unico.

"Já não sei falar sem ironia."